Ilustração de uma cena de carinho por Priscila Fonseca

Tabu, vida amorosa / deficiente

31 de janeiro de 2017

Ilustração de uma cena de carinho por Priscila FonsecaLembro-me de ouvir cada coisa…. Nós mulheres com deficiência somos tratadas e vistas como assexuadas. Nesse texto busco quebrar alguns tabus e contar mais uma parte da minha vida.

Minha irmã ria quando me perguntava como ia beijar. Meu pai falava coisas filosóficas as vezes, um dia disse: “As meninas buscam sair com outras mais bonitas para se sobressaírem e assim namorarem, por isso não te chamam para sair. ” Essa era a conversa quando tinha 17 anos. Achei que ia ter que tirar minha virgindade com um garoto de programa, pois não queria morrer sem provar o tão maravilhoso sexo. Como mulher é muito mais misterioso e oculto esse assunto. Sempre me senti muito insegura por algumas coisas que escutava da minha família.

Na escola sempre tive mais afinidade com os homens, o que era motivo de zoação: “A Pri gosta dele”. Muitas vezes a amizade acabava por conta dessas piadinhas. As vezes gostava de um garoto e falava para ele, mas no mundo adolescente isso é muito difícil. Passei a mentir que tinha namorado no segundo grau. Levava a foto do meu primo que também tem paralisia cerebral. Assim, as meninas paravam de zoar as minhas amizades com os meninos.

No mundo virtual vivi dois amores, várias aventuras e frustrações. Um cara foi leviano comigo. Ele tinha paralisia cerebral e morava em Porto Alegre, falava que gostava de mim e um minuto depois já dizia que era brincadeira. Sofri demais. O outro me mandava cartas e presentes. Era só um tipo de amizade e quando me contou que ia se casar disse que eu era mais gostosa do que sua noiva… Já um amigo de escola falou que se eu fosse “normal” seria um furacão. Pensei: “não sou “normal? ”, “Será que não vou encontrar ninguém que goste de mim como sou? ”. Entrava nesses sites de namoro apenas para rir, pois tinha medo e prometi a mim mesma que só iria fazer alguma loucura depois dos 35 anos, e até lá ia esperaria meu sapo encantado. Acreditem ele apareceu!

Texto que escrevi quando comecei a namorar

16 de fevereiro de 2011

Doidura e doçura de amor

No final do ano passado estava feliz comigo mesma e nem pensava em namorar. Como dizem, o amor acontece quando menos se espera.

A doidura do amor: fui ao interior do Rio de Janeiro visitar meus primos. Meu primo também tem paralisia cerebral e pinta com a cabeça. Ele pinta muito bem e ia expor seus quadros nos dias que estava lá.

Fui na abertura da exposição e meu primo me apresentou para todos. No final um rapaz veio até mim e falou rapidamente que ia comprar meu livro. Minha mãe falou o meu site para ele e ele me mandou e-mail no mesmo dia. Vi o e-mail já em BH e resolvi aceitar ele no MSN. Hoje ele fala que foi amor a primeira vista. Eu não achei que era sério no início e deixei acontecer. Claro que virou uma polêmica na minha família, especialmente quando ele falou que vinha me ver e pelo fato dele ser “normal”. Eu fiquei com medo porque aconteceu muito rápido. Só tem 3 meses que o conheci. Mas ele ficou doido de amor por mim.

A doçura do amor: Minha mãe me trata como trataria qualquer filha “normal”. Ela é uma ótima mãe. O rapaz chamado Glauber veio a BH pela primeira vez somente para me ver. Fiquei nas nuvens e não sabia o que fazer. Eu nunca tinha beijado… Eu estava nervosa, com medo e ele tirou tudo isso de mim e me deu beijos e mais beijos… Estou muito feliz de amar e ser amada. Achei que nunca ia ser amada como mulher. Os homens em especial têm muita dificuldade de amar uma mulher deficiente por não ver como mulher ou por não ter coragem de admitir a sociedade seu amor.Eu estava totalmente incrédula que existia amor e que alguém pudesse gostar de mim pelo que sou. O Glauber me mostrou que a minha deficiência não impede as pessoas de me ver como mulher e muito menos de ser amada. Por minhas experiências anteriores o Glauber não pode ser um homem comum, por ter a coragem e o desejo forte de me conquistar e querer ser meu namorado. É doido e doce o amor!


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Ele se tornou meu namorado por 5 longos anos. No início do namoro enfrentei uma mega luta para deixar o rapaz vir me visitar. Minha mãe, zelando por mim, dizia que ele tinha que dormir no hotel. Porém, ele não podia pagar. Agradeço minha tia por deixado ele dormir em sua casa somente uma noite, pois assim a parede de zelo se quebrou. Lembro da primeira vez que fomos passear sozinhos no shopping, minha mãe perguntou se ele iria me dá comida na boca. Pensei: “Claro, é meu namorado! ”. Me pergunto até hoje qual era a preocupação dela com relação a esses detalhes.

Com quase um ano de namoro, conversei com minha mãe para deixar que tivéssemos nossa primeira relação sexual. Falava que era muito difícil para uma mãe, (entendo!) mas concordou e vimos a melhor oportunidade. Depois disso dormíamos juntos sempre. Minha mãe é bem incrédula com o amor. Muitas vezes falava coisas negativas sobre Glauber, mas ele se mostrou sempre seguro, ao dizer que me amava acima da minha insegurança e do que os outros pensavam. Para ele era boa de cama, até acho difícil… Nossa relação sexual era boa e com muito respeito e carinho. Não tem nada de misterioso e nem complicado no sexo quando há amor. Só não é como vermos na TV. Já não sei se eu beijo bem ou não, pois com toda minha limitação motora é diferente (acho!). Mas para o Glauber parecia não ter nenhum problema. Gostava de me beijar e eu conseguia acompanha-lo, como todo mundo. Ele fazia de tudo para me ver feliz e era fofo. Acabamos terminando por vários motivos, demos um tempo e só ele nos dirá para onde vamos.

Hoje só tenho a agradecer ao Glauber por me mostrar que tudo é possível, o que é o sexo, o que é o amor e por me ensinar a amar e ser amada. Minha eterna gratidão e amor ao meu primeiro namorado.


1 Comentário

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  1. Margareth disse:

    Lindo Pri.
    Lindo mesmo. Emocionante. Ainda existem pessoas que enxergam a alma, muito além das aparências.

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